quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Areia



A cidade de areia era feita
E quando nela chegava um visitante
O eleito prefeito gritava “eita!”
Era Seu José que vinha todo elegante
Dizendo que povo é trabalhador
“construímos na areia um pedaço do nosso amor
por isso, não tenha medo,
Nossa Cidade de Areia não desaba não senhor.”
Seu Toninho, ao ouvir isso, se tranqüilizou
Instalou-se em seu quarto, e sua cama ajeitou
Debruçou-se na janela
Sentiu-se fora de perigo
Logo veio a lembrança dela
E a imaginou consigo
Desde que Joana fora embora
Outro caminho tentou Toninho
Se sentia melhor agora
Apesar de sempre sozinho...
Saiu pela rua afundando pé n’areia
Reparou nos moradores
Só tinha gente feia
Desistiu de outros amores...
Até que na esquina da Rua Conchinha
Com a Rua Mexilhão
Seu Toninho viu aquele ser que vinha
E disparou seu coração
Ela entrava na cafeteria
E ele decidiu que atrás dela iria
Entrou no ambiente logo atrás
Porem, se sentiu incapaz
Ficou com medo de um outro rapaz
E quase saiu para não voltar nunca mais
Mas Seu Toninho engoliu o medo
E ao lado dela, se sentou
Ela disse “Sua presença eu lhe concedo”
E ele, quase fogos soltou.
Moça esbelta, cheirosa, bonita
Perguntou-lhe o seu nome
Ela sorriu: “Anita”
“Aqui está o cardápio, tome”
Disse o garçom, apressado
Preocupado também com as mesas ao lado
“Antônio”, disse Seu Toninho
Com vergonha de um de seus apelidos
Falaram tomando um cafezinho
E pela conversa foram envolvidos
Nem perceberam o tempo
Que passou como o vento
“Opa, nem tanto assim
Se o vento passa muito rápido, o que sobrará de mim?”
Pensou a cidade.
Peço desculpas, sem ofensas retomarei minha rima.
Antônio (prometi que não o chamarei mais de Seu Toninho, ele não gosta)
Pagou a conta
E o que aconteceu depois, não é da minha conta.
Mas pedi ao Antônio “Conta, conta!”
E por eu ser a autora, ele levou em conta
E acabou contando a história; ponta a ponta.
Parece que Antônio e Anita, A Bonita, subiram ao quarto
Ele queria tomar um banho
Ela disse “eu te estranho!
Não sabes que de areia é feita a cidade
Qualquer pessoa de qualquer idade
Sabe que água a areia não agüentaria
E tudo que temos desmoronaria
Para tomar banho é preciso ir ao mar
Tirar a roupa num canto, e nele se jogar”
Assim foram os dois sob um céu lilás
Os pezinhos na areia quente
Nem olharam para trás
Mais bonito era o sol poente
Chegaram e sentiram vergonha
Ele olhou para ela e segurou sua mão
A dona do castanho olhar se mostrou risonha
E o coração, no mesmo lugar desde então

Saiu voando...


No meio do beijo, as roupas tiraram
Entre areia, mar e sal, se afogaram
Música, cantaram
E pela orla, andaram
E pela areia, rolaram
E pelo amor, se lambuzaram
Dançaram, amaram, gozaram...
Gritaram.
Não, não eles. Meu Deus, o pessoal da cidade!
Os dois se espantaram com tanta barbaridade
As ondas engolindo cada construção
Não havia tempo de nenhuma ação
Habitantes soterrados
Outros, afogados
Todos, desesperados
E os dois, desamparados
Em frente ao mar, despreparados
Recolheram suas roupas e seu ardor
E fugiram daquele cenário assustador
Foram para longe de tanto horror
Para viverem o amor
Arrebatador, salvador...
Saberiam que dali a pouquinho
A emergência seria acionada
Aproveitaram o ar marinho
E saíram fora sem ajudar em nada.
Hoje vivem na Cidade do Sonho
Que não é feita de concreto também
Mas são felizes, suponho
E a vida a dois lhes faz bem
Até hoje dizem que eleito prefeito
Gritava em meio aos escombros
“Juro que tudo estava direito!
Nunca para esta cidade dei de ombros!”
Ele sobreviveu, hoje vagabundeia
Moribundo, com certa idade
De corpo sujo, criando teia
Andando em círculos pela cidade
Onde
tudo
virou
AREIA.



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